O Relógio de Corda
Aqui há umas semanas falei-vos do meu caderno dos rascunhos.
Por vezes, lá me dá para (tentar) rabiscar uns poemas. Este já é bem velhinho, encontrei-o escondido pelas páginas. O engraçado é basear-se em factos que aconteceram realmente. E o que eu me ri a relembrar!
O Relógio de Corda
O relógio de corda da minha tia-avó
Bate as horas e as meias sem nunca de mim ter dó.
Nem tijolo, nem cimento, nada disso o faz calar
O mal é do raio da velha que tem corda p'ra lhe dar.
Dá uma volta e outra dá, gira a chave e gira mais,
Não esconde o sorriso velhaco que aprendeu nos telejornais.
Mas se algum deus de verdade existe, veio ali naquela altura,
Partiram as cordas forçadas, catapultas de amargura.
«Ó filho! estraguei o relógio, anda cá ajudar a tia,
Toma lá este dinheiro e vai cuidar da avaria».
Escondi o sorriso em esforço, como quem não sabe o que sente
Porque cá dentro de mim, já tinha o plano todo na mente:
Voltei sem nunca partir, a fingir enorme tristeza
«O conserto era tão caro, não valia a pena a despesa».
Eis que ela sorri novamente, desta feita em jeito de paz
«Não sou só eu a velhaca! és ainda pior meu rapaz».